Estudos de universidades mostram que “efeito Bolsonaro” ajudou na propagação da COVID-19

Pesquisas indicam que taxas de contaminação são maiores entre os seguidores do presidente

Levantamentos produzidos recentemente pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com o Instituto de Radioproteção e Dosimetria (IRD), e outro produzido pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e da Fundação Getúlio Vargas com a Universidade de São Paulo (USP) mostram como o discurso do presidente Jair Bolsonaro, minimizando os efeitos da pandemia da COVID-19 ajudou na propagação da doença nas regiões onde obteve resultados positivos nas eleições de 2018.

O levantamento da UFRJ/IRD, divulgado no início deste mês de outubro, cruzou os dados de expansão da doença com o resultado na votação em primeiro turno nas eleições presidenciais nos 5.570 municípios. Conclusão: há uma correlação entre a preferência pelo presidente Jair Bolsonaro e a expansão da COVID-19, o que pesquisa chama de “efeito Bolsonaro”.

Segundo informa uma reportagem da Folha de São Paulo, a pesquisa revela que para cada 10 pontos percentuais a mais de votos para Bolsonaro há um acréscimo de 11% no número de casos e de 12% no número de mortos.

“O estudo mostrou que a COVID-19 causa mais estragos nos municípios mais favoráveis ao presidente Bolsonaro. (…)Podemos pensar que o discurso ambíguo do presidente induz seus partidários a adotarem com mais frequência comportamentos de risco (menos respeito às instruções de confinamento e uso da máscara) e a sofrer as consequências.” – destaca o texto da pesquisa publicado na Folha.

Ainda de de acordo com os pesquisadores, esse foi o efeito que mais chamou a atenção, pois, em princípio, não haveria razão para explicar o motivo de cidades que votaram mais em Bolsonaro terem proporcionalmente mais mortes do que nos outros locais estudados.

“A argumentação que usamos no nosso artigo é que provavelmente trata-se de um efeito da própria postura do presidente, que minimizou o uso de máscara e a doença, chamando-a de gripezinha” – afirma o professor João Luiz Maurity Sabóia, outro pesquisador envolvido no estudo.

“É como se, com o seu discurso, Bolsonaro tivesse levado os seus eleitores ao matadouro”

A influência de Bolsonaro no comportamento de seus eleitores, verificada neste estudo da UFRJ/IRD, também aparece em outro levantamento em conjunto feito por pesquisadores da UFABC (Universidade Federal do ABC), da Fundação Getúlio Vargas e da USP (Universidade de São Paulo).

O estudo “Ideologia, isolamento e morte: uma análise dos efeitos do bolsonarismo na pandemia de COVID-19 ” mostra como as falas negacionistas do presidente Jair Bolsonaro em meio à pandemia podem sim estar colaborando com a morte de seus eleitores, principalmente.

Os autores também verificaram que o número de mortos por COVID-19 foi mais elevado nos municípios onde Bolsonaro obteve mais votação nas eleições presidenciais de 2018. “É como se, com o seu discurso, Bolsonaro tivesse levado os seus eleitores ao matadouro” – disse à Folha o professor da Universidade Federal do ABC Ivan Filipe Fernandes, um dos autores do estudo.

A pesquisa levou em conta as ocasiões em que Bolsonaro fez afirmações que minimizaram a gravidade da infecção e seus efeitos sobre o isolamento social, monitorado a partir dos dados de georrefenciamento de telefones celulares captados em todos os estados pela empresa Inloco. A cada vez que Bolsonaro minimizou a pandemia, foram registradas quedas significativas nas taxas de isolamento social em todos os estados – sem exceção.

Os resultados obtidos foram cruzados com a votação do presidente no primeiro turno de 2018 e com o número de mortes acumuladas por município, revelando que os óbitos foram maiores onde o presidente conquistou mais votos.

As conclusões de Ivan Fernandes e seus colegas no trabalho são reforçadas por um outro levantamento que foi agregado ao estudo realizado pelo cientista político Carlos Pereira, professor da FGV. Em sua pesquisas, Pereira constatou que o apoio ao isolamento social diminuiu entre os eleitores identificados como de direita à medida em que a epidemia foi se tornando mais grave no Brasil.

Numa primeira rodada com 7.848 entrevistas com esse tipo de eleitor, entre o fim de março e o começo de abril, 59% apoiavam o isolamento para combater a expansão da epidemia.
Em uma segunda vez, em que foram entrevistados 6.991 pessoas, os eleitores de direita foram questionados, entre o fim de maio e o começo de junho (após a maioria das declarações do presidente), o apoio ao isolamento havia caído para 41%. Nesta mesma segunda rodada 57% se colocaram contra o isolamento e 62% avaliaram de forma positiva o governo Bolsonaro.

Ainda no levantamento do pesquisador da FGV, 90% dos que se declararam conservadores, e que votaram em Bolsonaro em 2018, afirmaram que votarão novamente no presidente em 2022.

Segundo Pereira, o impacto substantivo de ser conservador é maior até que o medo da morte entre esses eleitores. “Ter proximidade com alguém que morreu por COVID-19 reduz em torno de 20% as chances do eleitor de direita votar em Bolsonaro. Mas possuir a identidade conservadora com o presidente pode garantir quase 90% de apoio desse eleitor à sua reeleição em 2022” – afirmou.

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