Carta aberta do Sindipetro-RJ aos movimentos sociais acerca da situação financeira de nossa entidade

Esta carta se dirige à militância do movimento sindical e de todos os movimentos sociais, do Rio de Janeiro em específico, mas também do Brasil, para esclarecer sobre a árdua situação financeira em que o Sindipetro-RJ se encontra.

Preferimos que se inteirem por nós mesmos sobre nossa situação, uma vez que a melhor maneira de lidar com duras dificuldades políticas é tratar da forma mais profundamente franca e transparente o problema que vivemos.

Entendemos o possível estranhamento que a informação possa estar causando, uma vez que nossa entidade é reconhecida, historicamente e não sem orgulho para nós, pela sua generosidade política manifestada em apoios dos mais diversos para toda e qualquer iniciativa em prol dos trabalhadores e do povo brasileiro.

Contraditoriamente, talvez, essa característica pródiga praticada por anos a fio, é também um fator que hoje se volta contra nós.

Não estamos desconectados de um contexto de dificuldades das entidades, sobretudo sindicais, que supomos ser generalizada, pelos informes que nos chegam.

No nosso caso, queremos registrar alguns fatos e tendências que alcançaram uma complexidade que exige do nós medidas duras, para evitar a insolvência de nosso sindicato.

Em primeiro lugar, não é possível tratar a questão financeira de forma descolada da questão política e histórica a qual atravessamos. Vivemos um momento bastante desfavorável na correlação de forças da luta de classes. Com a desconfiguração da geopolítica mundial bipolar nos anos 90, o capital encontrou terreno fértil para avançar na sua guerra ideológica e material, sem que houvesse a mesma capacidade de resistência por parte dos trabalhadores. No plano das ideias, valores como o individualismo, competitividade, ganância, imediatismo, etc., em detrimento das soluções coletivizadas, são bombardeados diuturnamente, principalmente pelos meios de comunicação empresariais, moldando o pensamento e o comportamento de gerações e gerações. Isso explica a principal razão do crescente descrédito nas entidades representativas, em especial as sindicais. Em consequência, observamos uma tendência acentuada de redução do quadro de associados ao Sindipetro-RJ. Não podemos de maneira nenhuma subestimar, também como fator a agravar essa tendência, a acomodação, encastelamento e desconexão das principais lideranças de gestões anteriores, levados a cabo por anos. Por fim, há que se levar em conta 2 grandes programas de demissão voluntária realizados nos últimos 4 anos, que desvincularam do quadro efetivo da Petrobrás cerca de 16,6 mil pessoas, por volta de 21% do total de funcionários. Dentre estes trabalhadores, muitos sindicalizados se desligaram automaticamente da entidade no ato da aposentadoria, e muitos destes acabaram por não solicitar revinculação sindical.

O quadro abaixo ilustra claramente essa forte tendência de redução das receitas em função da diminuição de associados. No início de 2012 tínhamos 6138 associados. Na eleição de abril de 2017 restavam-nos 4443. Notar que em 2016 já havia uma regressão da arrecadação oriunda de associados próxima ao nível de 2011:

Os últimos capítulos da política brasileira elevaram ainda mais o problema, uma vez que a reforma trabalhista levada a cabo por esse governo usurpador extinguiu o imposto sindical. Temos claro que a contribuição sindical compulsória tem raízes históricas na intenção de atrelamento do movimento sindical ao aparato estatal, portanto não sendo o mecanismo ideal de arrecadação, já que dificulta assegurar a autonomia e combatividade dos sindicatos. No entanto, o propósito claro das classes dominantes, longe de buscar restabelecer essa autonomia, é desmantelar estruturalmente o movimento sindical. O fato é que essa receita já respondia por cerca de 1/5 das nossas arrecadações, no ano passado.

Ao assumirmos a gestão, em junho de 2017, nos deparamos com uma situação aterradora, uma verdadeira bomba relógio. Encontramos contratos superestimados ou correspondentes a serviços injustificados. Foi identificado até mesmo pagamento de linhas telefônicas cujo aparelho não foi localizado. Em uma primeira revisão, até julho de 2017, cortamos mais de R$ 114 mil mensais em serviços, especialmente, os ligados a telefonia, impressão e distribuição de boletins, TV-WEB, Rádio-WEB, transmissão ao vivo e seus serviços de infraestrutura e relacionamento e suporte a outras entidades. Desde lá, continuamos a contenção das despesas (cerca de mais R$ 22 mil mensais) suspendendo alguns contratos e revisando outros.

Um necessário debate conceitual sobre a “máquina” sindical

Neste contexto de crise financeira do sindicato, é necessário fazer um debate conceitual sobre o caráter associativo do sindicato. O dinheiro e a máquina sindicais são patrimônio dos associados e sua função deve ser organizar a luta dos trabalhadores contra a exploração e a opressão do capital.

A profissionalização dos sindicatos mostrou-se um importante recurso para a luta da categoria, mas não sem contradições. Entre elas a relação funcionários (contratados e remunerados) e direção sindical (de caráter passageiro e voluntário). Formalmente o corpo diretor é um empregador, um patrão, há inclusive um sindicato de sindicatários (Sintesi), que busca os direitos trabalhistas, eventualmente em conflito com o sindicato. No entanto, sindicatos não são empresas, não apresentam lucro, apenas superávit ou déficit em suas contas. Em sindicato não há extração de mais-valia, não há luta pelo excedente gerado pela exploração dos funcionários do sindicato. Tampouco o sindicato se equipara a uma empresa de serviços ou um banco, que se apropriam de parte da mais-valia extraída pelo capital industrial. Ao contrário, toda a receita do sindicato origina-se da contribuição que vem do salário dos trabalhadores representados pela entidade, do setor mais consciente da classe que decidiu se associar para, aí sim, de modo mais organizado e eficaz, lutar por seus direitos, melhorias e contra a exploração e a opressão do capital.

Assim, a relação entre sindicato e seus funcionários não representa o conflito capital x trabalho. É mais complexo do que isso. A direção do sindicato tem que se preocupar em dar condições decentes de trabalho, ter uma relação de respeito e buscar envolver seu corpo funcional na atividade fim do sindicato. Mas o sindicato não pode ser uma ilha em um contexto social de precarização.

O equilíbrio entre esses dois polos em geral é difícil de ser alcançado e só podemos nos aproximar disso por meio do exercício democrático quotidiano – com seus acertos, erros e lições aprendidas. Por defender todos os direitos para a categoria, não implica que devemos concedê-los automaticamente aos funcionários do sindicato, uma vez que a entidade não se compara a uma empresa, conforme colocado. Porém, os ganhos trabalhistas dentro do sindicato não devem estar muito descolados do nível de conquistas da classe, sob pena de criar uma distorção. Tal distorção, adicionalmente, choca-se com a atual crise financeira da entidade.

O atual quadro do Sindipetro-RJ

Atingimos um patamar com uma máquina com déficits estruturais, em que a folha de pagamento chega a cerca de 82% da receita média do sindicato, com 50 funcionários. Somando isso aos outros gastos fixos, se inviabiliza a entidade, comprometendo a atuação do sindicato frente aos trabalhadores.

Os drásticos cortes que fizemos não foram suficientes e hoje o risco é o de não conseguir sequer pagar a folha salarial. Ou reestruturamos ou afundaremos.

Paralelamente, temos lutado com muito empenho para elevar a arrecadação através de campanha de filiação, obtendo resultados expressivos (cerca de 300 novos filiados em 10 meses), porém insuficientes. Envidamos fortes esforços em levantar finanças através de parcerias com outras entidades para o uso compartilhado de nossas instalações de comunicação (estúdios de rádio e TV). Porém, nesse contexto de crise generalizada, também não obtivemos sucesso.

Estamos lançando, em breve, um programa que permita contribuições mensais voluntárias, em diferentes quantias, por tempo determinado.

Porém todo esse esforço não foi capaz de reverter a tempo o desequilíbrio financeiro que nos empurra para uma situação insustentável.

O gráfico a seguir demonstra como a nossa capacidade de arrecadação, desconsiderando-se o imposto sindical, não acompanha o histórico de despesas crescentes nos últimos anos:

 

O fato do gasto de pessoal responder por 82% de nossos custos nos demonstra medida inevitável a ser tomada: demissões. Portanto, o critério de demissões é financeiro e estamos buscando mecanismos atenuantes para redução de volume e impacto destas. Iremos assegurar as indenizações as quais os afetados tenham direito, seja por garantia legal, seja por parâmetros do acordo de trabalho estabelecido entre as partes. Para assegurar tais indenizações, inclusive estamos nos endividando, uma vez que sequer temos disponibilidade em caixa para honrar esses compromissos à vista.

Não renovamos o ACT dos trabalhadores empregados do Sindipetro-Rj, sobretudo porque, na prática, o texto mal redigido do ACT expirado tem gerado divergência de interpretações em cláusulas, além de resultar num atrelamento ao ACT da Petrobrás que retira da direção do Sindicato, em vários pontos, a gestão dos recursos financeiros da entidade, atrelando-os em menor ou maior grau, à gestão de recursos humanos da Petrobras. E o momento que atravessamos não nos permite aumento de passivos por divergência de interpretação e nem de não ter controle e um acordo claro para que ambas as partes saibam qual é o benefício/ direito que está sendo garantido, sem margem a dúvidas.

Fizemos nos primeiros meses dessa gestão diversas reuniões, algumas com os empregados, para os quais passamos a situação financeira aqui exposta e deixamos aberto para sugestões de como fazer para enfrentar essa crise. Das sugestões feitas, praticamente todas já havíamos levado em consideração.

Estamos anunciando para venda/locação ativos imóveis de nosso patrimônio, no intuito de contribuir para reequilibrar as finanças. O fato inegável é que hoje o tamanho e a saúde financeira de nossa entidade, por razões históricas, fatos alheios a nosso controle e má gestões anteriores, lamentavelmente não sustentam mais a estrutura a qual nos foi legada.

Cabe esclarecer que a situação que passamos hoje é bem diferente da que o sindicato passou na década de 90, como alardeado por alguns que oportunamente fazem a oposição de ocasião. Diferente daquele momento que passávamos por uma situação conjuntural, nossa situação hoje é estrutural e não se resolve com um montante único de dinheiro vindo de doação, mas com aportes sistemáticos, ou com redução dos nossos custos de funcionamento.

Não é verdade que se está assediando ou constrangendo qualquer trabalhador a aceitar o que quer que seja, estamos, pelo contrário, garantindo o máximo de tempo possível de emprego e salário, buscando garantir que todos irão receber o que lhes é devido.

Tampouco é verdade que estamos terceirizando o jurídico do sindicato, pelo contrário, estamos buscando o fortalecer e o adequar para melhor atender à categoria, com mais agilidade, menor tempo para as execuções das ações, ter condições (que não existem hoje) de tratar de forma integrada e acompanhamento de perto um associado que chegue, por exemplo, com uma demanda de violência o trabalho. Quantas ações tem o Sindipetro em relação ao assédio moral, por exemplo? Se tomarmos por base o que temos levantado, impressão existe que os associados não nos procuram com essa demanda. Contratamos uma assessoria jurídica em caráter temporário e com fim específico, justamente para atuar naqueles processos que o jurídico do sindicato se considera parte, como a que envolve os trabalhadores, como no caso de demissões, ou de negociação de ACT.

Estamos organizando um sindicato que passou por anos de desorganização estrutural (exemplos existem aos montes). Não estamos isolados e não cumprir com obrigações advindas de legislações e normas geram diversas ordens de problemas. Não é verdade que a maior parte da atual direção estava na gestão anterior do Sindicato, pelo contrário, o índice de renovação de diretores foi de mais da metade do total da diretoria. Além disso, é um argumento de ocasião e eivado de má-fé afirmar que na gestão passada todos os diretores tinham igual acesso a tudo e que teriam, como consequência, ônus e bônus das ações igualmente equilibrados. Havia distorções de poder de ação entre os diretores que compunham aquela direção, sobretudo quando se toma por base a dita máquina: como exemplo, o cadastro do sindicato não era acessível se não para alguns poucos diretores. E o que dizer então da imprensa e seus editoriais que em sua maioria não representavam a posição do conjunto da direção? Um exemplo mais recente, no apagar das luzes da última gestão, o mesmo grupo que agora quer dividir o ônus de sua gestão de forma equânime queria pagar à CUT (não obstante a situação financeira que estamos passando) mais de R$ 300 mil antes de sair do sindicato, sob pena de não liberarem o valor para pagamento da nossa posse. Fizemos nossa posse com dinheiro emprestado. Esses são elementos que, inclusive, explicam a ruptura que foi feita, uma vez ultrapassado o limite aceitável para composição com aqueles que, curiosamente, na última eleição foram se juntar com quem mais criticaram desde 2007. Uma dúvida paira no ar: qual seria o posicionamento do Sindicato em relação ao equacionamento da Petros, se a chapa que perdeu de forma significativa as eleições passadas estivesse na atual direção?

Estamos longe de ser perfeitos, nós cometemos erros e continuaremos a cometer, mas com a esperança de estar buscando o que é certo.

Este diálogo franco já foi estabelecido de forma exaustiva junto à categoria petroleira, através de boletins informativos (3 edições) e assembleias, que nos deram aval por amplíssima maioria para seguir efetuando as medidas financeiras emergenciais.

Esperamos que a generosidade e solidariedade, as quais tradicionalmente somos reconhecidos, agora se deem no sentido inverso, e que num breve futuro voltemos aos tempos de prosperidade, em consonância com nossa importância política e nossa História de lutas e conquistas.

 

 

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